2007-11-20

Dias 45/46/47/48/49

Dias 45/46/47/48/49:
(Todos em um:)
Vá lá, acorda! Consegues ouvir-me? ACORDA!
Dou-me um estalo de um lado e depois do outro. Grito de novo: ACORDA!
Após um longo gemido abro os olhos remelosos que volto a fechar. Dou-me outro estalo e logo desperto. Ainda um pouco confuso observo o espaço enquanto me espreguiço, os meus ossos estalam, e encosto na cabeceira da cama. Estranho, não tenho noção do tempo mas estou no meu quarto.
A atonia dispersa-se e dá lugar a uma amálgama de memórias distorcidas. Poderá ser? Levanto-me, vejo as horas e o dia…é verdade, passaram cinco dias em que só dormi.
Dias 45/46/47/48/49.1:
Em flashbacks lembro-me:
Um homem, um castelo, uma mulher jovem, um concerto, uma mosca morta, um violino sem cordas, muitos relógios, um velho paupérrimo, pedinte, mendigo, uma mulher que chorava, um homem que ria, três crianças, aberrações, céu muito nublado, múltiplas viagens em vários transportes, um campo de futebol sem relva, sem jogadores, uma multidão despida, chuva, noite, uma bebedeira, murmúrios, uma velha sorridente cuja dentadura caía, um camião gigante, um atrelado, família, amigos, uma tenda aberta, um funil parecido a uma chaminé, jóias de ouro e prata, plástico derretido, papel rasgado que primeiro voava e depois se empapava em água, o oceano, as lágrimas salgadas, muitos pássaros, canários amarelos e vermelhos, pintassilgos, dois pombos que levantavam voo, papagaios, um pombo tão fino quanto papel, tripas no chão, um falcão, uma estrada sem rumo, sem indicações, paralelepípedos dispostos aleatoriamente no chão, um céu azul, ela, uma nuvem com asas de veludo, um casaco rasgado, um corpo deitado, um autocarro com as rodas no tecto, uma aranha de estimação, um coração parado, uma fotografia revelada, um pano manchado, uma máscara do fantasma, óvnis que faziam as pazes com os nativos, uma corrente de água muito forte, uma barco de papel, um navio com mercadoria, drogas, várias mulheres deitadas na estrada à espera que o navio passasse, um telhado de chocolate, congestionamento, uma taça de vinho tinto, uma mesa posta à espera da sobremesa, uma banda a tocar tachos e panelas com talheres, uma biblioteca sem livros, uma faca afiada, cartas por abrir, uma conversa, música surda, mais relógios, um ladrão de ovos, uma tesoura aberta, um guardanapo sujo, uma mulher anafada, uma lâmpada fundida, um tesouro na ilha deserta, cem palmeiras, um homem com uma espada, rádios sintonizados, volume alto, um computador desligado, um teclado verde, roupa de cabedal, um túnel iluminado, outra viagem, um comboio a apitar, o vapor da chaleira, o chá derramado, as formigas no açúcar, as mesmas formigas mortas, uma borboleta quadrada, a morte encarnada ao virar da esquina, uma transmissão via satélite, uma nave, uma igreja antiga, um túmulo, um visitante inesperado, calafrios na espinha, um palito que era um fósforo, explosões tornadas em fogo de artificio, o mesmo túnel durante o dia com as luzes apagadas, o sentimento que alguém me batia.
Dias 45/46/47/48/49.2:
Tento em vão organizar os “frames” mas não resulta.
Talvez seja assim que deve ser lembrado.
Não há conjunções…

Sem comentários: