2010-02-23

7-QC70/142282153.2310

7-QC70/142282153.2310
Press Rewind!
Go back ‘till the beginning!
Play!
-De volta. Mais um dia de poucos. Queria voltar ao início mas não posso. Estou encravado e não consigo mudar o passado. A máquina do tempo avariou-se. Ela nunca funcionou. Sinto-me Eu mas já não sou o mesmo Ego.
-Que nome me fui dar?!
-Ego…
-Eu…
-Quem sou Eu?
-Não sei.
-Continuei a jogar enquanto pude mas entretanto perdi-me no labirinto. Estava no 6º nível se não me engano. Quando larguei o jogo pensei que não ia voltar a jogar. Pensei desistir. Infelizmente decidi voltar a tentar. Foi pior ainda. Não me lembro dos comandos para me mexer. Como fiquei no labirinto e já não me lembro como era representado no mapa que uma vez arranjei. Estou perdido. Os créditos estão a acabar. Tenho medo. Tenho medo que chegue a fase em que o jogo dite a sentença: GAME OVER. O que fazer então? O que fazer agora?
Refresh…
Não é fácil ser uma personagem fictícia. Não é nada fácil existir numa não-existência.
Constantemente aparecem novos desafios no imaginário que é a realidade deste mundo e cada vez mais difícil se torna o percurso.
-Fases? -pergunto-me.
-Já deixei de acreditar em fases. Existe só uma grande e única FASE. Chama-se Vida e é uma merda. Feliz ou infeliz não importa, somente que é uma merda. Não digo isto por causa da Vida ser uma pessoa amarga que não se dá comigo. Não guardo qualquer ressentimento pela forma que ela me trata e posso até admitir que um dia a amei. (Escusado é dizer que ela foi ingrata e abandonou-me sem dizer porquê.) Mas isso não está em causa e juro a pés juntos que nada tem que ver com a nossa relação. Mesmo assim continuo. Devo certamente acreditar que o meu deus, aquele que supostamente é real, vai tomar precauções para que a Vida não me volte a fazer destas coisas. Só quero que a Vida seja real nem que seja de um modo imaginário. Quero viver sem dúvidas constantes, só porque vivo.
-Para quê?
-Por quê?
-Perguntas, somente dúvidas, sem objectivos concretos, ou melhor, sem objectivos concretizáveis. A existência assemelha-se a uma ofegante respiração de quem acabou de subir mil escadas, ao sufoco de quem correu horas sem parar. Horas não! Dias, anos, séculos!
-Estou tão fraco. Sinto-me tão fraco, tão inútil. Descartado pelo criador sem saber respostas.
-Porquê?
-Por que pergunto porquê?
-Porque me importo?
-Porque olho em volta com esperança?
-De quê?
As personalidades multiplicam-se.
-Só perguntas…
-Mais perguntas?
-Porque me perguntas?
-Como posso responder-me?
-Não sei!
-Não sei o quê?
-O que é que não sei?!
-Hã?!!
-O quê?!!!
-Gritos???
-De onde vêm?
-Daqui!
-Daqui onde?
-Da minha cabeça!
-De dentro da minha cabeça?!
-Pára!
(Ecos)
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára!
-Pára! 

2010-02-19

6-QC27/142282153.2017

6-QC27/142282153.2017
O tique de falar em verso lá passou e eis o tipo de dia que eu prefiro. Pensava que não chegaria tão cedo: o típico dia de Outono (em pleno Inverno).
Não está a chover, não está sol.
Não está frio nem está calor.
Está um dia perfeito. Estou sozinho e não me sinto sozinho, não estou feliz nem estou triste. Sinto-me capaz de criar. São bons estes dias. Trazem-me memórias nos cheiros, nos sabores, nos ambientes que me rodeiam. Um cigarro faz-me lembrar o dia em que estava a fumar um cigarro. Não sei porquê mas nestes dias vem-me sempre à cabeça esse dia. Foi um dia em que não se passava nada de especial, contudo está na minha memória, logo é especial.
Há dias assim, dias fúteis que são importantes para a minha personalidade.
Devo ter pensado muito nesse dia…

2010-02-18

5-QC17/142282153.1526

5-QC17/142282153.1526
Chuva, chuvisco, chuvinha
 que um dia há-de ser minha.
E quando assim for
 pintarei a chuva com cor.
Não sei como aconteceu,
estava ainda escuro como breu.
Acordei a rimar
 todas as frases disparadas para o ar.
Deve ser coisa ruim,
das que existem em Aboim.
Ou então doença má
Daquelas que já nem há.
De certeza estou doente
Ou não rimava constantemente.
Para acabar com a rima
Só um chá de lúcia-lima.
Só que o chá não funcionou,
Não percebo o que se passou.
Ah, é uma rima emparelhada
Meti-me numa bela alhada.
E assim não faço sentido!
O que sou, não tenho sido.
Só espero que passe rápido.

2010-02-16

4-QC6/142282153.1816

4-QC6/142282153.1816
A instrumentalidade da música deixa-me anestesiado.
Gostava de viver surdo para o mundo. Gostava que na minha surdez conseguisse ouvir música.

2010-02-14

3-LN0/142282153.1757

3-LN0/142282153.1757
Cadeiras, essa invenção abençoada pelos deuses, mesmo pelos que não existem, mesmo que nenhum exista. Cadeiras onde todos eles são representados, cadeiras onde me sento. Um trono? Por vezes sinto que passei a vida inteira sentado. Mais que deitado, a dormir, a meditar, certamente, e sento-me por um motivo maior ou sem motivo algum. É indiferente, cada pessoa se senta pelos seus motivos, não quero impingir os meus motivos a ninguém. Não tenho nada a ver com isso. A vida é deles, eu não tenho vida. Melhor falando, eu tenho vida, só não aquele tipo de vida que eles têm. É uma vida abstracta, virtual, existente num plano inexistente. Hoje tenho noção daquilo que sou e conheço os meus limites.
É a primeira acção concreta que tomo depois de este sonho de sei lá quanto tempo. Ainda bem que não sigo as regras temporais que o comum humano segue. Perdi a noção do tempo. Levanto-me, ando um pouco numa elipse e volto a sentar-me. É tão bom estar sentado, penso. Levanto-me, ando mais um pouco, sento-me de novo.
Venero cadeiras (mesmo aquelas que deixam o corpo dorido, dormente, quase paralisado). Eu não tenho corpo.
Sentado vejo o mundo.

2010-02-13

2-LN0/301142282.1632

2-LN0/301142282.1632
E depois de tempos passados em branco eis que acordo para um novo dia. Será que acordei???
Estive perdido. Os dias morreram um a seguir ao outro a meus pés. Limitei-me a vê-los cair, aterrados, já em estado de putrefacção, ali, no lugar onde os meus pés estavam assentes no chão. Eventualmente os pés tocaram os líquidos que saiam dos dias mortos. Eles não cheiravam mal, embora, à primeira vista, pudesse parecer. Com a morte dos dias, não os pude aproveitar.
Hoje é o primeiro dia que não me morre à frente – disse eu para mim próprio, um dia.
Decidi percorrê-lo um pouco. No entanto, não estando o dia morto, é como se estivesse eu. O corpo recusava-se a obedecer-me, caminhava automatizado pelas ruas, travando cambaleante. A minha mente, da mesma forma automatizada não me deixava sair do sonho.
Nas primeiras horas foi assim que vi o mundo. As pessoas a contorcerem-se em formas estranhas, olhavam para mim e não me viam, eu só via as suas formas. As vozes delas eram arrastadas, fortes, incompreensíveis. Todo o mundo estava envolvido numa névoa estranha. O dia também. Como um véu…
O peito começava a apertar. Decidi tomar medidas drásticas: sair do meu corpo.
Aquando desse pensamento soltei os braços dos meus braços. Levei os braços libertados à boca. Rasguei a minha boca de dentro para fora, alargando-a. Passei a cabeça pela abertura, soltei as pernas, apoiei os braços nos ombros para içar o resto do meu corpo. Passei uma perna, depois a outra e estava liberto. Cá fora, olhei para trás e lá estava a minha pele, o meu outro eu, parado a olhar para mim, enternecido.
Consegui, despira-me do meu corpo. Contudo, a dormência que sentia era a mesma, porventura maior que antes. Mesmo assim, continuei o percurso. A estrada era sinuosa, uma recta enorme. Neste mundo são assim as estradas, paradoxos.
Após ter feito quase um quilómetro, virei-me para trás e vi o outro Ego na mesma posição que o tinha deixado. Não tinha passado muito tempo quando o meu segundo corpo cedeu ao cansaço e deixou de obedecer às minhas ordens. Repeti os passos, movimento por movimento, como se se tratasse de uma coreografia, para deixar o segundo eu para trás, criando o terceiro. Vi-me, estava triste. Dei três passos e logo parei exausto. Nenhum dos sintomas passou. Deparo-me com um relógio, na torre. Horas, horas, horas, e horas.