2010-02-13

2-LN0/301142282.1632

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E depois de tempos passados em branco eis que acordo para um novo dia. Será que acordei???
Estive perdido. Os dias morreram um a seguir ao outro a meus pés. Limitei-me a vê-los cair, aterrados, já em estado de putrefacção, ali, no lugar onde os meus pés estavam assentes no chão. Eventualmente os pés tocaram os líquidos que saiam dos dias mortos. Eles não cheiravam mal, embora, à primeira vista, pudesse parecer. Com a morte dos dias, não os pude aproveitar.
Hoje é o primeiro dia que não me morre à frente – disse eu para mim próprio, um dia.
Decidi percorrê-lo um pouco. No entanto, não estando o dia morto, é como se estivesse eu. O corpo recusava-se a obedecer-me, caminhava automatizado pelas ruas, travando cambaleante. A minha mente, da mesma forma automatizada não me deixava sair do sonho.
Nas primeiras horas foi assim que vi o mundo. As pessoas a contorcerem-se em formas estranhas, olhavam para mim e não me viam, eu só via as suas formas. As vozes delas eram arrastadas, fortes, incompreensíveis. Todo o mundo estava envolvido numa névoa estranha. O dia também. Como um véu…
O peito começava a apertar. Decidi tomar medidas drásticas: sair do meu corpo.
Aquando desse pensamento soltei os braços dos meus braços. Levei os braços libertados à boca. Rasguei a minha boca de dentro para fora, alargando-a. Passei a cabeça pela abertura, soltei as pernas, apoiei os braços nos ombros para içar o resto do meu corpo. Passei uma perna, depois a outra e estava liberto. Cá fora, olhei para trás e lá estava a minha pele, o meu outro eu, parado a olhar para mim, enternecido.
Consegui, despira-me do meu corpo. Contudo, a dormência que sentia era a mesma, porventura maior que antes. Mesmo assim, continuei o percurso. A estrada era sinuosa, uma recta enorme. Neste mundo são assim as estradas, paradoxos.
Após ter feito quase um quilómetro, virei-me para trás e vi o outro Ego na mesma posição que o tinha deixado. Não tinha passado muito tempo quando o meu segundo corpo cedeu ao cansaço e deixou de obedecer às minhas ordens. Repeti os passos, movimento por movimento, como se se tratasse de uma coreografia, para deixar o segundo eu para trás, criando o terceiro. Vi-me, estava triste. Dei três passos e logo parei exausto. Nenhum dos sintomas passou. Deparo-me com um relógio, na torre. Horas, horas, horas, e horas.

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